O documentário “Nós que aqui estamos por vós
esperamos” tem 73 minutos de duração, foi feito por Marcelo Mazagão em 1998
aqui no Brasil, sendo exibido em 1999. Ele foi criado a partir de cenas de
filmes antigos, fotos e filmagens de acontecimentos reais, contendo pessoas
anônimas e personalidades que construíram a história do século XX. A edição é
surpreendente, as imagens mais antigas em preto e branco e as demais coloridas
levam o telespectador a vivenciar um pouco do que é apresentado, além de
algumas frases que antecedem as cenas, nenhuma palavra é proferida, os efeitos
sonoros de André Abujamra e Win Mertens conduzem toda a narrativa ilustrada.
Durante o filme surgem imagens de cemitério, no
final aparece a frase na entrada dele, o título do documentário “Nós que aqui
estamos por vós esperamos”. Muito intrigante e sem dúvida, uma boa sacada para
a história ali contada, porquanto o século XX foi marcado por muitos
acontecimentos que levaram a morte de diversas pessoas que tinham uma história
de vida, tinham sonhos e família. Afinal, como aparece no filme as imagens da
1ª Guerra e a história da família Jones, com a frase de Cristian Boltanski: “
Em uma guerra não se matam milhares de pessoas, mata-se alguém que adora
espaguete, outro que é gay, outro que tem uma namorada. Uma acumulação de
pequenas memórias”.
Os que ali nas imagens aparecem, esperavam por nós.
Hoje enterrados, serão para sempre lembrados devido a herança que nos deixou
(seus feitos, criação, alegrias, tristezas, conquistas e fracassos). Sem
dúvida, nós que aqui estamos (construindo a história), esperamos outros, que
virão, “Nunca dominaremos completamente a natureza e o nosso organismo
corporal, ele mesmo parte desta natureza, permanecerá sempre como uma estrutura
passageira, com limitada capacidade de realização e adaptação”. Dr. Freud.
Uma relação de vida e morte, evolução e revolução,
as mudanças ocorridas durante o século XX mostradas de uma forma marcante traz
reflexões sobre a humanidade, seus ideais, suas conquistas, suas perdas, o ser
humano evidenciado como egoísta e ambicioso, contrastando seu lado criativo,
forte e determinado. O século que teve como personalidades Hitler, Mussolini,
Stalin, Pol Port, Franco, Pinochet, Médici, Mao Tsé Tung, entre outros,
Garrincha, Fred Astaire, além de homens e mulheres que não tiveram seu nome
impresso nos livros de história, mas construíram ela. O homem é o agente
transformador do mundo. Ele tem o poder de construir e destruir, através de
suas ações podem ser evidenciados seus objetivos, uma paranoia, afinal, “Os
homens criam as ferramentas, as ferramentas recriam os homens”. Mc Luhan
Criação e morte, essas são as palavras, o século XX
foi marcado pela indústria bélica, avanços tecnológicos, científicos e inovação
na comunicação, após o invento do telefone, imagem (Kodak), do rádio, da
eletricidade e da psicanálise e a revolução na indústria automobilísticas com a
produção em massa (Ford T). Trabalhadores que montam carros, tendo uma dura
jornada de trabalho, mas não possuem o que produzem. O desemprego decorrente da
quebra da bolsa de Nova York, acompanhado da fome e da miséria dos
trabalhadores, pais de famílias, onde até mesmo os portadores de diplomas
perderam os seus devidos valores. O homem passa a ser objeto de um mundo
capitalista.
As destruições, bomba atômica, guerras, a crise
econômica nos Estados Unidos, a revolução cultural na china que foi muito
violenta, as extradições na serra Pelada aqui no Brasil, a queda do muro de
Berlim, mostra como o homem sempre em suas mudanças vai se recriando e se
adaptando a sua realidade, não se restringe somente a uma retrospectiva, mas
também a busca incessante dos sonhos e ideais dos seres humanos. Cita
intelectuais, cientistas e escritores que tiveram suas obras destruídas em
praças públicas.
Relata a conquista das mulher no mercado de
trabalho (nas indústrias bélicas, de cigarro tecnologias) com o lema “We can do
it” em vários lugares do mundo, bem como sua igualdade com os homens, se
envolvendo na política e nas artes. Passam a fumar, beber e a se vestir com
mais liberdade, uso de menores biquínis e minissaia.
A liberdade religiosa e o esquecimento de Deus por
muitos. Cena forte do monge budista Tashi Lungton que em protesto contra a
Guerra no Vietnã ateia fogo no corpo e queima até morrer. Um contraste entre a
paz e o amor, bem representado por Gandhi, e a crueldade, como o ocorrido na
Alemanha Nazista. Jovem chinês que enfrentou tanques, pessoas que se lançaram
sobre um punhado de arroz lançado no solo da Etiópia, os homens na Serra Pelada
em busca de ouro. Estes e tantos outros fatos que marcaram o século XX traz uma
reflexão sobre o indivíduo, este ser único inserido em uma coletividade e que
muda a si mesmo e ao mundo à sua volta o tempo todo. O que é a vida? Qual valor
é dado a ela? Se somos seres transformadores, de qual lado e de que forma seremos
lembrados?